Cooperacre cria aliança para o fortalecimento da produção agroextrativista

Durante três dias, a Cooperacre reuniu cerca de 200 extrativistas e representantes do setor produtivo para buscar alternativas que possam potencializar a produção agroflorestal e discutir os desafios que precisam ser superados para consolidar cadeias produtivas sustentáveis e inclusivas. A articulação dos extrativistas com a Cooperacre, o poder público, as organizações parceiras e as instituições de financiamento resultou em uma grande aliança para o fortalecimento da produção agroextrativista, com destaque para as cadeias produtivas da borracha, castanha-da-amazônia, café e polpa de fruta.

Nilva Cunha, extrativista e presidente da Cooperativa Santa Fé, em Capixaba, avalia que o destaque do encontro é ter uma comunicação mais direta e assertiva com governantes e representes do setor produtivo, a fim de colocar em discussão as dificuldades enfrentadas por sua comunidade no escoamento da produção. “Nós, que somos agricultores e extrativistas, vivemos e precisamos de apoio. Nós precisamos que nossa agricultura, nossa fruticultura, que a borracha e a castanha venham a ter um olhar melhor, principalmente na parte do ramal”, reforça a extrativista e líder comunitária.

O 1º Encontro de Fortalecimento da Produção Agroextrativista da Rede Cooperacre teve início no dia 19, no auditório do Sebrae, e contou com a participação de Milton Fornazieri, secretário de Abastecimento, Cooperativismo e Segurança Alimentar do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Ele ressaltou que, no Brasil, 33 milhões de pessoas passam fome e 110 milhões de pessoas não têm uma alimentação digna todos os dias. “Nesse contexto, é importante fortalecer e contar com as cooperativas e associações que produzem nossos alimentos. A agricultura familiar é responsável por 70% da produção de alimentos que vão para a mesa dos brasileiros. São alimentos saudáveis, livres de veneno e agrotóxicos”, destacou Fornazieri.

No dia seguinte, a programação teve continuidade na Universidade Federal do Acre (Ufac), primeiro, no Anfiteatro Garibaldi Brasil e, depois, no Centro de Convenções, onde foram realizados os trabalhos em grupo para discutir o potencial e os desafios da produção agroextrativista. “Só é possível manter floresta em pé se conseguimos obter um retorno financeiro para quem vive nela. Precisamos mostrar que é viável a cada uma dessas cadeias produtivas”, acredita José de Araújo, presidente da Cooperacre.

Emoção

Para o fechamento dessa aliança, não poderia faltar emoção. O fundador da Cooperacre, Manoel José da Silva, de 84 anos, participou do encontro e foi recebido de pé enquanto adentrava o auditório da eAmazônia. Seu Manoel, como é conhecido, fez questão de agradecer a todos que se envolveram na realização do evento e relembrou as dificuldades enfrentadas na criação da Cooperacre e o quanto a borracha era desvalorizada no mercado, chegando a ser pago aos seringueiros apenas dez centavos por quilo de borracha. Mesmo com as limitações da idade avançada, seu Manoel demonstrou uma profunda força de vontade e interesse em viver. “A vida não é pra sempre, mas, se fosse, eu ia batalhar por esse sempre”, disse o fundador da Cooperacre.

Desdobramentos

O presidente da Cooperacre, José de Araújo, afirmou que os temas colocados em pauta durante o encontro serão debatidos com cada associação e cooperativa local, além de uma reunião especial com a Cooperação Brasil-Alemanha (GIZ), que apoia projetos de proteção e uso sustentável dos recursos da natureza e busca ampliar os mercados para produtos oriundos do extrativismo amazônico.

Representantes da Cooperacre também irão a Brasília para cumprir agenda com uma equipe da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a fim de tratar da subvenção diferenciada. A propósito, o deputado estadual Edvaldo Magalhães (PCdoB) disse que irá apresentar na Comissão de Serviço Público, Trabalho e Municipalismo da Assembleia Legislativa do Acre a proposta de aumento do subsídio estadual da borracha, passando de R$ 2,30 para R$ 5,00. A proposta será colocada em pauta ainda no mês de abril.


Júlio Barbosa, presidente do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), relembrou a devastação ocorrida na Amazônia nas décadas de 1970 e 1980, quando o Estado era conivente com a ocupação de fazendeiros que queriam transformar a floresta em pastagem para o gado bovino. Naquele contexto histórico, Chico Mendes organizou uma comitiva e levou 111 seringueiros a Brasília, onde tiveram a oportunidade de conversar com o presidente do Congresso, Ulisses Guimarães.

Passado de lutas e conquistas

O encontro resultou em um pedido de socorro para as populações da Amazônia e rendeu duas pautas importantes: uma política de reforma agrária diferenciada para a região e a garantia de um preço justo para a borracha dos seringueiros. O que Chico Mendes e todos que o acompanharam não imaginavam é que desse encontro resultaria uma conquista ainda maior: a criação de reservas extrativistas na Amazônia.

“Esse tipo de reserva só existia no Brasil e em canto nenhum do mundo. Conquistamos 20 milhões de terras que pertencem à coletividade de um povo. E ainda precisamos avançar na política de reforma agrária. Não existe extrativismo se não houver território regularizado e protegido. E ainda temos mais de sessenta milhões de hectares de terra por essa Amazônia afora que ainda não foram destinados a ninguém, que estão jogados à própria sorte e onde, muitas vezes, está organizada o crime de ocupação de terra”, disse Júlio Barbosa.

Sobre a Cooperacre

Atualmente, a Cooperacre exporta para oito países e possui 22 associações e cooperativas filiadas, que atuam no fortalecimento das cadeias produtivas da borracha, castanha-da-amazônia, café, palmito e polpa de frutas. Além do Acre, adquire matéria-prima dos estados do Amazonas, Mato Grosso e Pará, com negociação para ampliar essa relação comercial com os estados do Amapá e Roraima e os com os países vizinhos Peru e Bolívia.

Em 2022, movimentou mais de 38 milhões de reais em bioeconomia, beneficiando diretamente cerca de quatro mil famílias extrativistas. Somente na cadeia da borracha, foram produzidas 720 toneladas, gerando 8,6 milhões de reais. Com a coleta da castanha, o retorno ao produtor foi ainda maior: 24,5 milhões de reais com a comercialização de 350 mil latas de castanha (cada lata custa em média 70 reais). Já na cadeia do café, a expectativa para 2023 é comprar cerca de seis mil sacas, gerando 650 mil reais.

Sobre o encontro

O 1º Encontro de Organizações Agroextrativistas do Acre é realizado pela Cooperativa Central de Comercialização Extrativista do Acre (Cooperacre), Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetacre), SOS Amazônia, Conselho Nacional de Populações Tradicionais (CNS) e Organização das Cooperativas do Brasil (OCB/AC), com o apoio da empresa Veja, GIZ Brasil, Frente Parlamentar do Cooperativismo (Frencoop), Secretaria de Planejamento do Acre (Seplan), por meio do Programa REM Acre – Fase II, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Universidade Federal do Acre (Ufac) e Instituto de Estudos da Amazônia (IEA).

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